Varinha mágica

O Natal é uma data que me desperta os sentimentos mais contraditórios, positivos e negativos, e, simultaneamente, lembranças, boas (algumas), e ruins (uma infinidade delas) de todas as outras festividades do nosso calendário ocidental.

Afinal, ninguém tem o poder de controlar o que quer e o que não quer que fique retido na memória. Bem que gostaria de ter, somente, excelentes recordações, e não apenas neste período especial, mas em todos os momentos de todos os anos, até para corroborar minha personalidade, que é, sobretudo otimista. As más lembranças, todavia, acompanham-me à minha revelia.

Tenho postura um tanto ambígua em relação ao Natal. Reflito, claro, todos os anos, no seu significado religioso, na importância e transcendência do magnífico presente doado à humanidade pelo Criador do universo, com seus bilhões de galáxias e “zilhões” (e o termo, aqui, é usado em sentido indeterminado, para caracterizar uma quantidade fantástica, mas impossível de ser quantificada) de estrelas: ou seja, seu próprio filho, que assumiu as condições humanas para nos indicar o caminho da imortalidade.

Todavia, não condeno quem encara a data pelo seu sentido, digamos, “profano”, de mera festa, oportunidade para se comer bem (para os que podem, claro) e se alegrar. Também festejo-a com essa alegria, junto às pessoas que amo e às quais ensinei os princípios (inclusive este) nos quais acredito e pauto a minha vida, no caso, os meus filhos.

Natal é a grande oportunidade que tenho de reunir minha prole (relativamente vasta), de pôr as conversas em dia, de manifestar e receber amor e de, por conseqüência, somar uma boa lembrança a mais no “panteão” de recordações que a cada instante recebe novos acréscimos.

Outro aspecto, digamos “profano”, que cultivo é o de presentear àqueles que estimo, não somente parentes, mas muitos amigos que considero irmãos (se não de sangue, pelo menos de espírito). Claro, como qualquer mortal comum que se preze, gosto demais de ser presenteado, não importa o valor da dádiva. O que é fundamental para mim é o fato de que alguém se lembrou que existo e disse, concretamente, por ações que prescindem de palavras: “olhe, gosto de você”. E isso é bom demais!!!.

De uns tempos a esta parte, alguns Natais têm sido um tanto mais tristes, pelo “desfalque” de pessoas muito queridas que, quando vivas, mesmo que não se fizessem presentes às ceias (e muitas vezes não se faziam mesmo), jamais se ausentavam da lembrança. Claro que elas jamais se ausentarão enquanto eu viver. A diferença é que agora “só” estão vivas, mesmo, na memória. Não podem, inesperadamente, no correr da ceia, telefonar-me desejando-me um bom Natal (e vice-versa), como costumavam fazer.

Primeiro foi a vez do meu pai a se ausentar, para sempre, dos meus festejos natalinos. Que falta que este “velho” querido (era assim que o tratava carinhosamente) me faz! Sua ausência é uma lacuna que jamais virá a ser preenchida por quem quer que seja.

Neste Natal, terei outro desfalque a me entristecer. Trata-se da minha sogra, na verdade segunda mãe, que nos deixou recentemente, bem no início deste mês de dezembro. Na hora da ceia, tenho certeza, a verei sentadinha do meu lado, servindo-me, como sempre fez, as minhas partes preferidas do peru, o vinho da minha predileção na temperatura exata de que gosto e outras tantas iguarias gostosas, que ela preparava com tanto gosto e carinho para mim.

Mas se é verdade que a família teve alguns “desfalques” (e jamais irei entender o mistério da morte), contou, também, com valiosos “acréscimos”. Em 1998, por exemplo, ganhei um genro, o Horácio. Em 2000, foi a vez do Pedro, meu primeiro neto, se incorporar ao clã. Em 2004, o Emerson, que há tempos freqüentava a casa como um dos nossos, adquiriu essa condição, de fato e de direito. Foi o segundo genro que ganhei.

E a família não parou (felizmente) de crescer. No ano passado, teve a adesão de um novo integrante. Ganhei meu terceiro (e último) genro, o Francis, e não ganharei outros só porque não tenho mais filhas para casar. Não vejo a hora, porém, do meu único filho homem, o Alexei, “presentear-me” com uma nora, para ciúmes da minha amada esposa (pois as mães, embora invariavelmente neguem, têm esse sentimento em relação aos filhos homens).

Finalmente, neste Natal terei o acréscimo mais recente, a “jóia da coroa”, a pérola da família, a “cereja do bolo”. Trata-se do meu segundo neto, o João Vítor, que nasceu neste ano e que terá seu “batismo de alegria” na sua primeira (de muitíssimas tenho certeza) festa natalina em família.

Apesar da forma ambígua com que encaro essa data, não posso negar que nenhum outro evento do ano, mas nenhum mesmo, é tão importante para mim quanto este. Por que? Dou voz ao reverendo Norman Vincent Peale – que considero uma espécie de Padre Antonio Vieira evangélico, pois como o sacerdote português, também foi um estilista do idioma, embora do inglês – para responder por mim, por expressar, melhor do que eu, a razão dessa importância: “O Natal agita uma varinha mágica sobre todo o mundo, e observe, tudo é mais suave e mais bonito”.

Queiram ou não, sejam religiosos ou profanos, cristãos ou ateus (não importa). A grande verdade é que este evento transforma as mentes e os corações de todos e consegue o milagre de, num passe de mágica, tornar bonito e bom até o que é sabidamente horrendo e ruim. Feliz Natal!!!!





Jornalista, radicado em Campinas, mas nascido em Horizontina, Rio Grande do Sul. Tem carreira iniciada no rádio, em Santo André, no ABC paulista. Escritor, com dois livros publicados e detentor da cadeira de número 14 da Academia Campinense de Letras. Foi agraciado, pela sua obra jornalística, com o título de Cidadão Campineiro, em 1993. É um dos jornalistas mais veteranos ainda em atividade em Campinas. Atualmente faz trabalhos como freelancer, é cronista do PlanetaNews.com e mantém o blog pedrobondaczuk.blogspot.com. Pontepretano de coração e autêntico "rato de biblioteca". Recebeu, em julho de 2006, a Medalha Carlos Gomes, da Câmara Municipal de Campinas, por sua contribuição às artes e à cultura da cidade.

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