O tempo e o senso comum

O senso comum trabalha em nossa sociedade como um conjunto de regras e conhecimentos que determinam se um indivíduo pertence àquele grupo. Se ele é aderente ao senso comum, se pensa como todos, se tem os mesmos valores, ele é aceito.

A terra é redonda... óbvio
Mulheres podem votar e trabalhar... óbvio
Negros e brancos têm os mesmo direitos... óbvio

Mas nem sempre foi assim!

Já ouviram falar do ovo de Colombo? Depois que alguém nos prova que podemos viver de uma forma diferente, com novos valores e paradigmas, nós olhamos para o passado e desdenhamos o pensamento antigo, como se nossos antepassados fossem inferiores e não enxergassem o óbvio.

Segundo George Berdard Shaw:
“O homem sensato adapta-se ao mundo.
O homem insensato insiste em tentar adaptar o mundo a si.
Sendo assim, qualquer progresso depende do homem insensato.”


Só que, até aceitarmos a modificação do senso comum, estes “insensatos” lutam contra moinhos de vento da sociedade. Mereceriam o nosso respeito e admiração, só que, ao contrário, são ridicularizados.

A História serve a propósitos mais nobres do que nos contar como foi o passado, mas, sim, entender o nosso presente e direcionar o futuro. Nos dias de hoje, existem muitos destes “insensatos” lutando para mudar os valores da sociedade. Batalhando para modificar o senso comum.

Se partirmos do pressuposto que a Humanidade já atingiu a maioridade moral, o ápice intelectual ou o clímax religioso estaremos cometendo os mesmos deslises e equívocos em que incorreram nossos antepassados, ou, até mesmo, nós próprios há algumas décadas.

Há poucos séculos, o homem escravizava negros ou índios para labutarem em suas lavouras ou em trabalhos domésticos. Estes escravos eram capturados e forçados a trabalhar e, na maioria dos casos, eram comercializados como objetos em feiras e leilões.

Durante todo o período da escravidão nas colônias, muitas pessoas com valores humanistas e algum senso ético se levantaram contra a escravatura. Por este motivo, eram tratadas como ignorantes, insensatos e agitadores. Segundo os senhores de escravos da época, estes abolicionistas não entendiam nada de economia e estavam indo contra o progresso do país e do mundo. Era “provado” que a economia necessitava da mão-de-obra escrava. Era óbvio...

O tempo passa... e olha a gente hoje:

Experimente assistir ao Canal do Boi ou outro destes canais de TV que apresentam leilões de animais. Assista com algum senso crítico, traçando um paralelo entre a época da escravidão e os dias de hoje. Só mudaram os atores. A história e as personagens são as mesmas.

Na época da escravidão, se falava que o negro não tinha alma... em verdade, eu não sei nem se o ser humano tem uma alma. Nada disso é provado. E é este argumento que é hoje usado para dizer que podemos criar um outro animal como um vegetal, comercializá-lo como uma mercadoria e abatê-lo quando quisermos, pois, segundo o senso comum o boi não tem alma. Um frango não tem alma. Um porco não tem alma.

Falar em proteção aos animais e comer bife, defendendo a ingestão de carne animal utilizando-se de argumentos baseados na medicina com informações parciais tão antigas quanto a famigerada “pirâmide alimentar” é o mesmo que continuar a favor da escravatura dos negros e índios.

Pense um pouco mais. Reflita.

Quando é que iremos perceber que continuamos vivendo os mesmos erros de sempre? Quando iremos parar de olhar pro passado, dizendo: “como era bárbaro o Homem de antigamente”?





O jornalista Marcello Pepe (MTB 19259/MG) trabalhou por muitos anos para o jornalismo brasileiro nos Estados Unidos, onde pode editar, redigir e diagramar vários periódicos brasileiros. Lançou em 1997 o premiado PlanetaFax, sendo o primeiro informativo diário em português nos EUA. Atualmente, é gestor do Relaciono, professional coach, palestrante e professor de comunicação em público. Confira o novo blog de Marcello Pepe em www.marcellopepe.com

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