Parecer tonto pode ser vantajoso

Há poucos dias um amigo promotor de Justiça me contou sobre algumas estratégias que usa para tornar suas causas vencedoras. Disse que entre tantos recursos de que lança mão, de vez em quando procura se mostrar frágil para tornar o oponente mais vulnerável.

Pouco antes da disputa coloca os óculos quase na ponta do nariz, curva o corpo, inclina a cabeça e fala com voz abafada. O adversário se enche de confiança e não o ataca com veemência. Aos poucos, entretanto, meu amigo vai levantando a cabeça, endireita o corpo, solta a voz e se transforma.

Nesse momento o adversário se intimida e perde o controle da situação. Quando meu amigo parte para o ataque quem se torna impotente é o adversário. Só para ter ideia de como a teatralização funciona basta dizer que ele é considerado o melhor promotor de Justiça da nossa história.

Esse é só um exemplo. Tenho amigos que rezam todos os dias para agradecer à natureza por terem nascido com cara de tonto. Há outros ainda, como esse meu amigo promotor de Justiça, que fazem de tudo para disfarçar e parecerem desligados e inofensivos. Dizem que a cara de parvo desarma resistências e os ajuda a conseguir o que desejam com menos esforço do que se parecessem espertos.

Ou seja, esperto é aquele que não afugenta as pessoas posando com jeitão de águia. Por sinal, essa comparação, embora comum, é injusta, pois meu avô dizia do alto da sua experiência que a águia ataca suas vítimas fazendo "piu, piu" e não "xô, xô".

Há algum tempo o apresentador de televisão Carlos Massa, conhecido como Ratinho, deu entrevista no programa "De frente com Gabi". Ele contou sobre as fazendas e emissoras de rádio e televisão que comprou nos últimos anos. Aplicou bem o dinheiro que recebeu e amealhou uma fortuna considerável.

As pessoas têm interesse em saber como ele conseguiu tanto sucesso. Para explicar sua habilidade de bom negociante disse: "Deus foi tão bom comigo, Marilia Gabriela, que até cara de tonto ele me deu. Quando o nego vai negociar comigo, pensa que está ganhando. Eu deixo, vou brincando e quando ele vê já assinou o cheque".

A televisão apresentou há algum tempo o seriado "Columbo", protagonizado pelo ator Peter Falk. Eram histórias de um detetive de Los Angeles chamado Columbo que com seu jeitão inofensivo desvendava os crimes mais complexos. Para caracterizar sua personagem, Falk usava um sobretudo bege surrado e um carro Peugeot 403 conversível com pintura desbotada.

Chegava a ser ridicularizado pelos colegas da polícia e pelos criminosos. Com esse jeito desligado e ar de tonto, ele surpreendia a todos desvendando com inteligência incomum os casos mais intrincados. Um bom exemplo que pode sair das telas e se incorporar à realidade do nosso dia a dia.

Ter cara de tonto, entretanto, não significa ser tonto. Ao contrário, somos avaliados, admirados e respeitados pela nossa inteligência. A questão está no fato de querermos, às vezes, sem necessidade, demonstrar essa esperteza e levantar resistências desnecessárias ou prevenir interlocutores ou oponentes para que usem suas melhores armas contra nós.

O perigo é deixar que a vaidade fale mais alto e querermos sempre parecer espertos, ágeis e fortes. Essa pode ser uma armadilha que montamos para nós mesmos, pois o outro se protegerá reunindo toda sua energia para se tornar vitorioso. É uma decisão que precisamos tomar: queremos parecer espertos ou sermos vencedores?

SUPERDICAS DA SEMANA

- Não queira parecer esperto demais.
- Parecer inofensivo ou frágil pode, às vezes, evitar resistências.
- Analise e procure aprender com o comportamento dos bons negociadores.
- Parecer tonto não significa ser tonto. É só uma estratégia.





Reinaldo Polito é Mestre em Ciências da Comunicação, Palestrante, Professor de Expressão Verbal e Escritor. Escreveu 15 livros com mais de um milhão de exemplares vendidos. Seu site www.polito.com.br

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