Alma nova

O início de cada novo ano é recebido de maneiras muito diferentes pelos três principais tipos de pessoas que existem: os otimistas, os pessimistas e os indiferentes, aqueles que deixam a vida rolar, sem esperar e nem desesperar demais dela. Observe-se que otimismo não implica em alienação, pelo menos não necessariamente. É uma predisposição pessoal, uma postura positiva, uma atitude de esperar sempre o melhor, mesmo nas piores circunstâncias e situações.

Já o pessimismo, óbvio, é o comportamento diametralmente oposto. É o de achar que nada no mundo é tão ruim que não possa piorar. É a postura das pessoas que no fundo da consciência esperam mais da vida e das pessoas do que estas provavelmente lhes irão dar e que, quando essas expectativas não são satisfeitas, enxergam tudo e todos sob o prisma da decepção e da frustração, ou seja, cinzento, enfumaçado, opaco e, portanto, ruim.

Creio que a humanidade se divida, grosso modo, em partes praticamente iguais desses três tipos de personalidade. Talvez haja, admito, um pouquinho a mais de pessimistas, em decorrência, até, da imensa horda de famintos, miseráveis e sofredores que povoam o Planeta.

Otimismo, pessimismo e indiferença, porém, não dependem intrinsecamente de condições econômicas e/ou sociais. Conheço muita gente que não tem rigorosamente nada de seu, ou seja, usando jargão popular, não tem nem “onde cair morta”, mas que não abre mão da esperança de dias melhores.

É alegre, de uma alegria de causar estranheza e inveja em quem não consegue senti-la, confiante e, sobretudo, batalhadora. Como sempre espera o melhor, não mede esforços para a sua obtenção, acreditando que tanto esforço trará, mais dia menos dia, resultados favoráveis (mesmo que nunca traga).

Em contrapartida, cruzo, a todo o momento, com pessoas privilegiadíssimas, que têm muito mais do que fazem ou fizeram por merecer, que jamais passaram por qualquer espécie privação, que não têm a mínima carência, nem material e nem afetiva e que, no entanto... têm a alma parecida com um reservatório de vinagre. São azedas, desagradáveis e, principalmente, insuportáveis. São como aves de mau agouro. Na verdade, sequer sabem o que querem.

Quanto aos indiferentes, há milhões, mundo afora. Estes, em vez de pensarem na vida, limitam-se a viver. Pouco desejam, mesmo que nada tenham. E quando têm, contentam-se com a posse, sem questionar se o que possuem é muito, pouco ou apenas o suficiente. Creio que essas pessoas, à sua maneira, até sejam felizes. Ao contrário dos otimistas, estes sim são alienados, na mais pura e legítima caracterização de alienação.

Esses três tipos, portanto, nem poderiam ter as mesmas expectativas em relação ao início de cada novo ano. Têm posturas opostas e, forçando um pouco a constatação, até “almas” diferentes. Raramente mudam. Embora não se saiba em que momentos da vida assumiram essas posturas, essas findam por serem definitivas.

O otimista revê o que de positivo lhe aconteceu no ano que termina e acredita, sem titubear, na pior das hipóteses, que as mesmas coisas voltem a lhe acontecer. E na melhor... Espera surpresas agradáveis e oportunidades renovadas. Quanto aos fracassos, não lamenta por eles. Avalia onde errou e busca corrigir esses erros, para que não mais se repitam.

Já o pessimista sequer menciona o que de positivo lhe ocorreu. Talvez nem saiba identificar. Provavelmente, sequer se dá conta dessa ocorrência. Concentra-se nos insucessos e busca se prevenir para que estes não se repitam.

Fá-lo, todavia, de forma equivocada. Isola-se de tudo e de todos e vê, nas situações mais triviais, corriqueiras e inocentes do cotidiano, perigos que só ele enxerga. Encara o início de um novo ano como um ano a menos de vida. E alguns chegam ao exagero de desejarem a morte, na qual vislumbram o fim dos seus sofrimentos, na maior parte, apenas, imaginários (ou exclusivamente temidos).

Nesse aspecto, os indiferentes levam vantagem sobre os outros dois tipos. Não espera vitórias e nem teme fracassos. Apenas ignora ambos. Festeja o início de novo ano porque todos o fazem, sem emprestar ao momento nenhum significado especial.

Creio que esses três tipos de pessoas deveriam raciocinar como Gilbert Keith Chesterton sugere: “O objetivo de um ano novo não é que nós deveríamos ter um ano novo. É que nós deveríamos ter uma alma nova”.

E você, querido leitor, como encara a superação de mais uma etapa, com o consequente início de uma nova, com todo o potencial, positivo e negativo, que ela traz ou pode trazer? É otimista, pessimista ou indiferente?

Não farei nenhum juízo de valor e reservo minhas críticas (ou elogios) apenas a mim mesmo. Porquanto, qualquer que seja sua postura, lhe desejo, com absoluta sinceridade, um FELIZ ANO NOVO! E, se possível, de “alma nova”.





Jornalista, radicado em Campinas, mas nascido em Horizontina, Rio Grande do Sul. Tem carreira iniciada no rádio, em Santo André, no ABC paulista. Escritor, com dois livros publicados e detentor da cadeira de número 14 da Academia Campinense de Letras. Foi agraciado, pela sua obra jornalística, com o título de Cidadão Campineiro, em 1993. É um dos jornalistas mais veteranos ainda em atividade em Campinas. Atualmente faz trabalhos como freelancer, é cronista do PlanetaNews.com e mantém o blog pedrobondaczuk.blogspot.com. Pontepretano de coração e autêntico "rato de biblioteca". Recebeu, em julho de 2006, a Medalha Carlos Gomes, da Câmara Municipal de Campinas, por sua contribuição às artes e à cultura da cidade.

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