Missão pessoal

A missão do homem jamais se esgota. Ai daquele que deixa o espírito envelhecer, que não renova idéias, informações, estilos e comportamentos! É posto de lado como objeto imprestável, sem uso, e perde o respeito até dos que gerou. Isso é mais comum do que se pensa e que seria desejável. Quando o sujeito acha que sua missão está cumprida – ou, o que é muito mais comum, que não tem mais forças e capacidade para assegurar seu cumprimento – estará completamente derrotado. Tornar-se-á peso morto para a família e a sociedade e só lhe restará esperar a morte. Mesmo que essa atividade extemporânea, essa reciclagem necessária para continuar atuante, esgote mais depressa as energias e abrevie o fim, é melhor assumir esse risco do que se tornar imprestável.

Cesare Pavese, em uma de suas conferências, em 13 de junho de 1941, observou: "Se é possível lançar mão da analogia com o dia, a velhice é a idade mais aborrecida porque não se sabe mais o que fazer de si, como a noite, quando a faina diária está concluída". Isto, quando o espírito envelhece. Para evitar esse brutal tédio, é necessário que consideremos nossa tarefa sempre inconclusa. Que nunca venhamos a aposentar o nosso raciocínio, o nosso interesse pela vida, a nossa participação no mutirão para tentar civilizar a espécie. Reitero: a missão do homem jamais se esgota, embora ele ache que sim.

“E quem não tem nenhuma?”, perguntará o atento leitor. Todos têm, mesmo que se trate de algo comezinho e trivial, que sequer considere com esse pomposo nome e nem mesmo se dê conta dessa obrigação pessoal que se impôs. Essa missão pode ser, por exemplo, a de garantir conforto e segurança à família, o que é mais comum. Ou simplesmente superar a pobreza ou até a miséria e ter uma vida melhor, pelo menos um tantinho digna. Até marginais, bandidos tidos e havidos (por de fato serem) nocivos à sociedade têm lá suas missões pessoais, posto que inconsistentes e nocivas. Quando mais não seja, sua missão pode ser, por exemplo, a de jamais ser preso em decorrência de suas ações ilegais e criminosas.

Quem estabelece, de forma consciente, uma tarefa positiva a cumprir, que nem precisa ser grandiosa, para justificar e qualificar sua vida, deve, antes de tudo, ser autodisciplinado e coerente em pensamentos e ações, para, assim, ter pelo menos mínimas chances de cumpri-la. Se não conseguir... paciência. Pelo menos restará o mérito (ou simplesmente o consolo) de haver tentado (isso quando tentar). Nada e ninguém, portanto, devem deter nossos passos em nossa jornada em busca da concretização da nossa missão de vida. Certamente, reitero, todos temos uma, mesmo que conscientemente desconheçamos isso e sejamos incapazes de identificá-la de forma clara e coerente.

Viemos ao mundo com uma tarefa a cumprir, sem que nos seja sequer revelada qual é. Compete-nos descobrir a nossa, de acordo com nossas vocações e competências, e executá-la, sejam quais forem as circunstâncias. Obstáculos, certamente, encontraremos, e em profusão, em nosso caminho. Teremos inúmeras quedas. Mas o verdadeiro homem, mesmo enfraquecido e fragilizado, sempre conseguirá se levantar, e prosseguir, sem desespero ou esmorecimento, para realizar sua missão.

Recompensas podem ou não vir. Nem sempre (ou raramente) vêm. Não raro, não teremos sequer o reconhecimento dos que viermos a beneficiar. Não importa. O importante é que cumpramos, com honestidade, nossa missão. Gibran Khalil Gibran nos exorta, em seu magnífico “O Profeta”: “Anda. Parar é covardia e olhar para a cidade do passado é ignorância”.

As pessoas não dogmáticas, com sede e fome de conhecimento, que se mantêm permanentemente ligadas ao mundo, dispostas a aprender tudo o que possam, são as que têm as maiores chances de mudar, sem que tais mudanças impliquem em traumas. Claro que a incerteza dita o destino humano. Agora estamos vivos. No segundo seguinte, poderemos não estar mais. E a vida – embora espiritualistas garantam que não, baseados apenas nas próprias convicções – não tem reprise. Se tivesse, a humanidade não estaria privada dos gênios e santos que com suas ações e exemplos fizeram o homem evoluir e que tanta falta fazem hoje.

O norte-americano Stephen Richards Covey, autor do best-seller “Os sete hábitos das pessoas muito eficazes”, dá algumas sugestões úteis aos que se empenham no cumprimento de suas respectivas missões pessoais. Recomenda: “A forma mais eficaz que conheço para começar com o objetivo na mente é desenvolver uma declaração de missão pessoal, filosofia ou credo. Ele se concentra naquilo que a pessoa deseja ser (caráter) e fazer (contribuições e conquistas), e nos valores ou princípios nos quais o ser e o fazer estão fundados. Uma vez que cada indivíduo é único, uma declaração de missão pessoal irá refletir sua unicidade, tanto na forma quanto no conteúdo”.

Ainda a essa propósito, o filósofo norte-americano Will Durant, em seu clássico “A filosofia da vida”, lembra: “A realização cria mais realizações; graças a pequenas conquistas ganhamos confiança para as grandes; a prática fomenta a vontade”. É isso. Devemos “treinar”. Ou seja, apostar na prática, começando por pequenos objetivos que, ao serem atingidos nos darão confiança para buscarmos as grandes façanhas, muitas aparentemente inviáveis, mas que poderão nos surpreender e se tornar não só possíveis, mas concretas. Para isso, porém, teremos que agir.

Finalmente, deixo-lhes como derradeira recomendação esta, feita por Idel Becker: “Procura ter um coração que não endureça, um caráter que não se abrande e um tato que não fira”. Mas a mensagem final que deixo é a mesma do início destas reflexões. Ou seja, que você tenha em mente que “a missão do homem jamais se esgota”, enquanto tiver um mínimo de lucidez, de forças e de sopro de vida.





Jornalista, radicado em Campinas, mas nascido em Horizontina, Rio Grande do Sul. Tem carreira iniciada no rádio, em Santo André, no ABC paulista. Escritor, com dois livros publicados e detentor da cadeira de número 14 da Academia Campinense de Letras. Foi agraciado, pela sua obra jornalística, com o título de Cidadão Campineiro, em 1993. É um dos jornalistas mais veteranos ainda em atividade em Campinas. Atualmente faz trabalhos como freelancer, é cronista do PlanetaNews.com e mantém o blog pedrobondaczuk.blogspot.com. Pontepretano de coração e autêntico "rato de biblioteca". Recebeu, em julho de 2006, a Medalha Carlos Gomes, da Câmara Municipal de Campinas, por sua contribuição às artes e à cultura da cidade.

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