Moderno ou só renovado?

A busca pela “modernidade” sempre foi, é, e certamente será a obsessão de artistas de todas as artes e não somente deles, mas de todas as pessoas. Ninguém aceita ser considerado antigo, arcaico ou ultrapassado em suas idéias, ações e comportamentos. Este é um fato. Não é um fenômeno atual, do século XXI, mas um comportamento recorrente de indivíduos de todas as épocas. E isso é ruim? Desde que obsessivo, sim.

A tal “modernidade”, pelo menos como a grande maioria a entende, no frigir dos ovos não passa daquilo que William Shakespeare constatou e expressou em um de seus inspirados sonetos: “vestir no velho o novo”. Ou seja, é mera troca de roupagem. Salvo uma ou outra exceção, não se trata de criar o que não existe e que seja de fato inovador, mas meramente de “renovar” o que já há. Se esta renovação implicar em alguma evolução, tudo bem. Contudo, não é o que ocorre na maioria das vezes.

No meu modo de entender, pois, não há, rigorosamente, o “moderno”. Há, isto sim, o renovado, o reciclado, a mesmice de sempre expressada de outra forma que não a costumeira. Conceitos, idéias, objetos, manifestações artísticas, comportamentos etc.etc.etc. mantêm enjoativa repetição, como uma espécie de mantra, posto que expressados de maneira diferente, o que não significa “melhor”.

Sou, por exemplo, visceralmente contrário aos escritores que burlam as normas do idioma a pretexto de serem “modernos”. Há os que, por exemplo, escrevem textos enormes, sem pé e nem cabeça, extirpando toda a acentuação e pontuação. No que isso facilita o entendimento dos leitores? Rigorosamente, em nada. Muito pelo contrário.

Se levarmos em conta que a escrita é uma das formas mais nobres de comunicação, quem pratica essa bobagem não é, em absoluto, moderno. E muito menos escritor, embora se julgue tal. É confuso, enrolador, desorganizado e até desonesto, ao pretender mostrar ao seu público (se é que o tem), o que sequer é.

Há, também, os que aboliram todas as maiúsculas, sem a menor justificativa para tanto. E posam de “modernos”. Desdenham dos que os criticam, achando-se gênios e dando a entender que o “resto” não passa de um bando de tolos. Idiotas são os que lhes dão atenção, ou os seguem ou os incensam.

A característica fundamental, básica, primária de um escritor é saber usar a ferramenta de trabalho de que dispõe – a palavra escrita, óbvio – para comunicar idéias, criar histórias, ensinar, informar, esclarecer, emocionar e divertir. Qualquer violação das normas que regem o idioma é uma intolerável heresia. Modernidade você não expressa na forma, mas no conteúdo. Do que o mundo precisa, mais do que nunca, é de boas novidades, que melhorem os relacionamentos e a vida de todas as pessoas.

O que é tido por moderno, hoje, um dia será considerado arcaico, ultrapassado, antigo e talvez até sem serventia. Quando isso tende a ocorrer? Nunca se sabe. Pode ser nas próximas 24 horas ou no próximo milênio. Mas fatalmente ocorrerá. Tudo muda. A mudança é a principal característica do universo e, por conseqüência, da vida.

É mister que se observe que nem sempre as inovações são melhores do que aquilo que é deixado para trás, notadamente no movediço terreno da moral, por exemplo, e do comportamento social. O conhecimento, porém, a despeito das transformações, é cumulativo. Daí insistir em dizer que o moderno não é mais do que o antigo renovado, com pintura nova, mesmo que não passe de superficial demão de tinta, deixando entrever a esmaecida pintura anterior.

Concordo, posto que parcialmente, com Augusto Frederico Schmidt quando desabafa: “Estranha coisa é o mundo! Dentro de alguns anos, tudo estará perdido e esquecido”. Tudo: desejos, obras, impérios, monumentos, catedrais etc. E nós, se não lograrmos, de alguma maneira, sobreviver nas mentes e nos corações da posteridade, o que é tarefa para titãs.

A verdadeira inovação ocorre com a sucessão de gerações. O que de mais “moderno” podemos deixar se não nossos filhos, desde que condicionados a pensar, a agir, a construir, a criar, a suprir necessidades (próprias e alheias), a serem solidários, justos e a passar todos esses conceitos e atitudes aos seus sucessores, que por sua vez agiriam da mesma forma e assim sucessivamente? Essa é a modernidade que importa.

Porquanto, queiramos ou não, a nossa realidade é a descrita por Cassiano Ricardo, no magnífico poema “Relógios”, que diz: “Diante de coisa tão doída/conservemo-nos serenos/cada minuto da vida/nunca é mais, é sempre menos./Ser é apenas uma face/do não ser, e não do ser./Desde o instante em que se nasce/já se começa a morrer”. Pensem nisso!





Jornalista, radicado em Campinas, mas nascido em Horizontina, Rio Grande do Sul. Tem carreira iniciada no rádio, em Santo André, no ABC paulista. Escritor, com dois livros publicados e detentor da cadeira de número 14 da Academia Campinense de Letras. Foi agraciado, pela sua obra jornalística, com o título de Cidadão Campineiro, em 1993. É um dos jornalistas mais veteranos ainda em atividade em Campinas. Atualmente faz trabalhos como freelancer, é cronista do PlanetaNews.com e mantém o blog pedrobondaczuk.blogspot.com. Pontepretano de coração e autêntico "rato de biblioteca". Recebeu, em julho de 2006, a Medalha Carlos Gomes, da Câmara Municipal de Campinas, por sua contribuição às artes e à cultura da cidade.

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