No tempo certo

O tempo, posto se trate de conceito abstrato, de símbolo criado e convencionado pelo único animal inteligente da natureza – pelo menos dos que se tem certeza que existam – não deixa de ser, simultaneamente, concreto. Mesmo sem sua simbologia, caso não existisse, perceberíamos (e percebemos) sua existência e, por consequência, seu transcurso ou sua passagem. É tema inesgotável que, por mais que se escreva a propósito, sempre se omitirá uma infinidade de aspectos.

A enciclopédia eletrônica Wikipédia, por exemplo, com a objetividade que a caracteriza, traz uma série extensíssima de informações sobre o assunto, mas, por mais objetiva que possa ser, sequer se aproxima do seu esgotamento. Nem poderia. É inesgotável. Entre minhas cerca de 2.200 crônicas, por volta de um terço tratam do tempo, sob seus mais variados aspectos e, para dissecá-lo (já nem digo por completo, mas de forma apenas remotamente aproximada), teria que viver dezenas de vidas e dedicar todos os anos delas a escrever a propósito e, mesmo assim, não conseguiria. Exagero? Longe disso.

Para que vocês entendam a complexidade do tema, sequer existe uma definição desse conceito que seja precisa, incontestável e, portanto, consensual. Tentem defini-lo. O que é o tempo? Não me refiro a clima, uma de suas conseqüências e tomado (erroneamente) como seu sinônimo. Nem às formas criadas pelo homem para sua medição. Muito menos à sua padronização, que foi feita, apenas, por volta da primeira metade do século XIX.

Não é sua conceituação matemática que me interessa e muito menos a física, que se baseia, por sua vez, nos conceitos matemáticos. É seu aspecto filosófico o que mais me intriga e estimula o raciocínio (provavelmente ampliando as conexões de neurônios do cérebro, expandindo sua capacidade. Afinal, esse nobre órgão, que comanda todos os demais, requer, como eles, exercício constante para permanecer saudável e se desenvolver).

Já que mencionei a Wikipédia, transcrevo conceituações de alguns estudiosos do tema, citados pela enciclopédia eletrônica. Um deles é o físico teórico norte-americano John Archibald Wheeler, que afirmou que o tempo “é o jeito que a natureza deu para não deixar que tudo acontecesse de uma vez”. Embora sua observação tenha um quê de poético, não se tratou, óbvio, de um poeta. Foi um cientista (morreu em 2008) e dos mais respeitáveis, tendo, em seu currículo – além de ter sido um dos últimos colaboradores de Albert Einstein – o pioneirismo na elaboração da teoria da fissão nuclear, posteriormente comprovada na prática.

Já o “pai da teoria da relatividade” definiu o tempo (conforme a Wikipédia informa) com uma só palavra: ilusão. “Mas como?!!”, perguntará, atônito, o leitor, que esperava uma conceituação mais precisa de um gênio dessa envergadura. Mas Albert Einstein confirma sua constatação: “A distinção entre presente, passado e futuro não passa de uma firme e persistente ilusão”. Há como contestar? De que forma? Baseados no quê?

Ainda aproveitando as informações da Wikipédia, a enciclopédia eletrônica cita antiga frase, que era dita e repetida “n” vezes por dia pelos locutores da Rádio Relógio do Rio de Janeiro, que considero um primor e com a qual concordo plenamente: “Cada segundo que passa é um milagre que jamais se repete”. Há como contestar afirmação tão óbvia, mas que quase nunca (ou nunca mesmo) nos damos conta?! Claro que não!

Vocês certamente já notaram que escrevi, escrevi e escrevi, que estas descompromissadas reflexões de hoje estão chegando ao final e que ainda não dei uma única definição de tempo, mesmo que remotamente aceitável. E é preciso? Em nosso íntimo, temos a noção exata, posto que não verbalizada, do que se trata. Wikipédia informa que crianças de colo não têm essa percepção e acrescenta que “adultos com certas doenças neurológicas e/ou psiquiátricas podem perdê-la”.

Mas não quero deixar vocês na mão. Se não tenho uma definição (mesmo que sumamente canhestra) desse conceito abstrato, posto que de percepção concreta, reproduzo esta conceituação (imprecisa, como todas que já li, mas que pelo menos nos dá uma idéia do que estamos tratando) da Wikipédia:

“Com base na percepção humana, a concepção comum de tempo é indicada por intervalos ou períodos de duração. Pode-se dizer que um acontecimento ocorre depois de outro acontecimento. Além disso, pode-se medir o quanto um acontecimento ocorre depois de outro. Esta resposta relativa ao quanto é a quantidade de tempo entre estes dois acontecimentos: à separação temporal dos dois acontecimentos distintos dá-se o nome de intervalo de tempo; à separação temporal entre o início e o fim de um mesmo evento dá-se o nome de duração. Uma das formas de se definir depois baseia-se na assunção de causalidade”.

Como se trata de tema recorrente em minhas abordagens – literárias ou filosóficas, não importa – certamente voltarei a ele, em algum momento que julgar oportuno, que tanto pode ser amanhã, como em dois, três ou mais anos. Afinal, respeito a colocação feita por Salomão (tido e havido como um dos homens mais sábios do remoto passado em que viveu), em um dos seus livros bíblicos, quando constatou: “Tudo tem seu tempo certo debaixo do sol”. E não tem?





Jornalista, radicado em Campinas, mas nascido em Horizontina, Rio Grande do Sul. Tem carreira iniciada no rádio, em Santo André, no ABC paulista. Escritor, com dois livros publicados e detentor da cadeira de número 14 da Academia Campinense de Letras. Foi agraciado, pela sua obra jornalística, com o título de Cidadão Campineiro, em 1993. É um dos jornalistas mais veteranos ainda em atividade em Campinas. Atualmente faz trabalhos como freelancer, é cronista do PlanetaNews.com e mantém o blog pedrobondaczuk.blogspot.com. Pontepretano de coração e autêntico "rato de biblioteca". Recebeu, em julho de 2006, a Medalha Carlos Gomes, da Câmara Municipal de Campinas, por sua contribuição às artes e à cultura da cidade.

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