A prioridade das prioridades

O maior defeito do Estado brasileiro, entre os tantos que podem ser apontados, é a incompetência na definição das prioridades nacionais. E não me refiro, especificamente, ao governo atual, ao qual, aliás, apoio e aprovo (o que nunca escondi de ninguém), sobretudo em decorrência dos avanços sociais que propiciou. Também ele, todavia, peca nesse quesito. Não se pode, em sã consciência, classificar o Brasil de país pobre. A rigor, não é. É, isso sim, injusto na partilha das riquezas que tem e que gera. Nesse aspecto, infelizmente, está entre os piores do mundo. Esta, todavia, é outra história. Mas o Brasil é rico. Afinal, trata-se da sexta maior economia mundial de acordo com a classificação mais recente, baseada no Produto Interno Bruto, que de uns tempos para cá cresce a conta-gotas. Como se vê, não é pouco.

E olhem que nem estou levando em conta os tantos e tantos recursos naturais inexplorados que o Brasil possui, muitos dos quais não foram, ainda, sequer descobertos. Estes são imensos e são cobiçados por vários povos, que não dispõem de tão grande potencial. O Brasil é rico, sim senhores. É riquíssimo, posto que boa parte de sua riqueza permaneça imobilizada, sem gerar os efeitos positivos que poderia e deveria para o conforto e tranqüilidade do seu povo. Portanto, o problema brasileiro não é a ausência de recursos. É sua má gestão. É seu subaproveitamento. É a catastrófica falta de visão dos vários governos para direcionar capitais aos setores prioritários, multiplicadores de riquezas.

E quais seriam as prioridades de um Estado realmente equilibrado e que pretendesse exercer o seu papel fundamental? São, basicamente, três: Educação, Saúde e Segurança, nesta ordem. E dentro do setor educacional, é a valorização do ser humano, do agente disseminador de conhecimentos, da fonte de todas as profissões que usam o intelecto como ferramenta de trabalho. Claro que me refiro ao professor. Sem ele, não existiriam o médico, o engenheiro, o advogado, o jornalista, o militar, o escritor, o padre e assim por diante. É algo tão óbvio que seria até desnecessário citar. Ou alguém acha que o conhecimento surge do nada, por geração espontânea? Todavia, o que ocorre hoje com o mestre?

Alguém conhece alguma categoria profissional relativamente pior remunerada do que esta, se for levada em conta sua importância? Estive estes dias com a cópia do holerite de agosto do ano passado de uma professora de nível 1, aposentada, após prestar 28 anos de dedicado e contínuo trabalho. O valor da remuneração ali constante fez-me entender, em sua verdadeira extensão, o principal motivo das sucessivas crises que nos atormentam há tanto tempo com periodicidade de causar pasmo. Por uma questão de respeito à mestra – respeito este que o Estado não tem com ela – não irei citar o valor da sua remuneração. Deixo por conta do leitor especular qual ela é. Só posso afirmar que é irrisória, muito inferior ao ganho de qualquer pessoa que exerça trabalho braçal (sem nenhum menosprezo a esse tipo de profissional).

Onde a lógica disso? E o Estado, ao invés de exercer seu papel, atua como “empresário”, explorando petróleo, fabricando aço, produzindo papel e outras coisas mais, que seriam atribuições exclusivas da iniciativa privada, muito mais competente, racional e ágil no mundo dos negócios! As folhas de pagamento das estatais são escandalosamente altas. Causam irritação no mais cordato e pacato dos cidadãos, e com razão. E por que isso acontece? Por incompetência na definição de prioridades. Por escandalosa inversão de valores. E pensar que os professores, sem os quais nenhum desses gerentes, engenheiros, economistas e sabe-se lá mais o que (cuja competência e capacidade ninguém desmerece) das empresas estatais sequer existiria, ganham tão mal!

Governar é definir prioridades. Qualquer pessoa minimamente instruída sabe disso. E há, por eventualidade, o mínimo argumento contrário à atribuição da educação como a preocupação prioritária de qualquer sociedade civilizada? E não me refiro, especificamente, ao ensino, à instrução formal nos seus mais diversos níveis. Não é apenas de “diplomados” que o País precisa. Refiro-me a algo mais amplo, à Educação no seu real sentido, que abrange desde normas simples de civilidade e de cortesia às complexas escolhas de ideais pelos quais batalhar. Do que carecemos não é de medidas econômicas ortodoxas ou heterodoxas, como fomos “bombardeados” até tempos não tão distantes, nem de capitais fartos do Exterior e muito menos de sofisticada tecnologia alheia, inútil se não soubermos fazer uso dela.

Prescindimos também de novas leis, ditadas de cima para baixo, ao contrário do que se verifica no Primeiro Mundo. A maioria dessas normas está tão desvinculada da nossa realidade que sequer “pega”. Cai no esquecimento por falta de uso. O Brasil carece de educação! E nos dois sentidos. Tanto no significado lato do termo, quanto no estrito, de estimular o cidadão a pensar. Há, é mister admitir, iniciativas inteligentes e eficazes, aqui, ali e acolá neste Brasilzão enorme e tão complexo.

As iniciativas positivas no País – e há muitas, reitero, posto que a maioria delas o público raramente chega a tomar conhecimento – em geral, e estranhamente, passam batidas, literalmente em brancas nuvens. Deixam, pois, de obterem adesão, de se tornarem corriqueiras e de serem imitadas do Oiapoque ao Chuí. Já os modismos estúpidos, chulos e passageiros espalham-se com rapidez maior do que fogo em um capinzal seco. Está mais do que na hora do Brasil deixar de ser o “País do futuro” e atentar para o presente, para não perder o bonde da história. E a “máquina do tempo”, que fará essa transposição num piscar de olhos, talvez com a velocidade da luz, é a Educação. Esta tem que ser, de fato e não somente nos discursos vazios e hipócritas dos políticos (cuja credibilidade está abaixo de zero), nossa “prioridade das prioridades”.





Jornalista, radicado em Campinas, mas nascido em Horizontina, Rio Grande do Sul. Tem carreira iniciada no rádio, em Santo André, no ABC paulista. Escritor, com dois livros publicados e detentor da cadeira de número 14 da Academia Campinense de Letras. Foi agraciado, pela sua obra jornalística, com o título de Cidadão Campineiro, em 1993. É um dos jornalistas mais veteranos ainda em atividade em Campinas. Atualmente faz trabalhos como freelancer, é cronista do PlanetaNews.com e mantém o blog pedrobondaczuk.blogspot.com. Pontepretano de coração e autêntico "rato de biblioteca". Recebeu, em julho de 2006, a Medalha Carlos Gomes, da Câmara Municipal de Campinas, por sua contribuição às artes e à cultura da cidade.

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