Precisamos de certezas

A maior tortura que temos, provavelmente, na vida é a incerteza, seja lá do que for. Todavia, ela é a grande característica dessa aventura magnífica, que é a possibilidade de viver. Nunca estamos absolutamente certos de quase nada (diria, para ser mais exato, de nada mesmo). Não temos certeza de que a profissão que escolhemos é a mais adequada, de que a decisão que tomamos (não importa de que natureza) é a correta, de que o amor que dedicamos a alguém é plenamente correspondido (mesmo que as manifestações dessa pessoa, seus atos e reações, dêem essa indicação) e vai por aí afora.

No caso dos relacionamentos, a prova de que nunca estamos seguros da plena correspondência da amada é o sentimento do ciúme, que todos temos em algum momento, posto que em intensidades variáveis, de acordo com nossa formação e personalidade. Todos somos, em algum momento, aquele personagem de William Shakespeare, o Iago, desconfiados da fidelidade da nossa Desdemona particular.

Certeza, mesmo, só tenho duas e ambas baseadas exclusivamente na lógica: a da existência, imanência, transcendência e eternidade de Deus (não exatamente com as características que o vulgo Lhe atribui) e de que um dia, que não sei quando, vou morrer. No mais... Tudo é incerto, duvidoso, passivo de comprovação. E quando comprovamos alguma coisa, a prova nunca é cabal, irretorquível, absolutamente convincente, sem nenhum aspecto obscuro carente de maior esclarecimento.

Qual é a fonte dessa compulsória incerteza? É, sem dúvida, o desconhecimento. Fôssemos oniscientes, não haveria o mínimo espaço para o duvidoso, o misterioso e o incerto. A ciência humana (ou o que entendemos como tal) ainda é muito rudimentar para nos dar já não digo todas as respostas, mas pelo menos as elementares.

A todo o momento, conceitos tidos e havidos como verdadeiros – não raro, como dogmas imutáveis – são derrubados e substituídos por novas descobertas. Até meados do século XIX, por exemplo, vírus e bactérias eram desconhecidos e as pessoas acreditavam, sem pestanejar, na “geração espontânea”.

Foi preciso o trabalho paciente (e competente) de um Louis Pasteur para demonstrar que isso era absurdo. Que apenas vida pode gerar outra vida. No Século XVI, quem dissesse que a Terra era redonda e orbitasse o Sol (e não o contrário), seria tido como insano, se não como herege. Galileo Galilei Galileu que o diga. Pagou duríssimo preço por afirmar o contrário do que era dogma da Igreja.

Nosso conhecimento sobre o mundo que nos cerca, embora achemos que seja extraordinário, é ínfimo, ridículo, pífio, diante do que há, ainda, por aprender. Imaginem em relação ao universo! Portanto, convém não sofrer em demasia com as incertezas. É prudente, sobretudo, não as transformar em “doenças do espírito”.

Haveremos de conviver com elas – múltiplas, variáveis, intensas ou fracas – enquanto vivermos. Morris West escreveu, a respeito, no romance “O Verão do Lobo Vermelho”: “O povo precisa de certezas. Até a certeza de morrer é uma ajuda para muitos. A doença do espírito é uma doença de desconhecimento e incerteza”.

Se as incertezas, porém, são um tormento (e de fato são), não deixam, por seu turno, de ter também um lado positivo. São, ao lado da necessidade, as grandes propulsoras do progresso. É em busca de certezas que pesquisamos, inquirimos, procuramos, estudamos, nos esforçamos às vezes até o nosso limite e nos expomos às mais variadas experiências, na busca da verdade (ou do que julgamos como tal).

Ela é a inesgotável fonte da Filosofia, a “mãe de todas as ciências”, que nos desafia, desde o princípio dos tempos, a responder três questões fundamentais: o que somos, de onde viemos e para onde vamos? Respostas para essas aparentemente simples (no entanto, intrigantes) perguntas foram dadas milhões de vezes, por milhões de pessoas, em todos os tempos e lugares. Nenhuma delas, todavia, soou convincente.

Persiste a incerteza. E, por persistir, gerações e mais gerações (se o homem não se destruir antes e não eliminar a vida do Planeta), seguirão com forte motivação para estudar, perquirir, pesquisar, procurar e se esforçar ao limite máximo de suas forças em busca da verdade. Preciso, como todos, de certezas. Onde e, principalmente, como obtê-las é a questão que me desafia e continuará a desafiar enquanto permanecer na Terra, vivendo essa aventura incerta e, por isso, tão fascinante.





Jornalista, radicado em Campinas, mas nascido em Horizontina, Rio Grande do Sul. Tem carreira iniciada no rádio, em Santo André, no ABC paulista. Escritor, com dois livros publicados e detentor da cadeira de número 14 da Academia Campinense de Letras. Foi agraciado, pela sua obra jornalística, com o título de Cidadão Campineiro, em 1993. É um dos jornalistas mais veteranos ainda em atividade em Campinas. Atualmente faz trabalhos como freelancer, é cronista do PlanetaNews.com e mantém o blog pedrobondaczuk.blogspot.com. Pontepretano de coração e autêntico "rato de biblioteca". Recebeu, em julho de 2006, a Medalha Carlos Gomes, da Câmara Municipal de Campinas, por sua contribuição às artes e à cultura da cidade.

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